quarta-feira, 26 de junho de 2019

Roteiro de quadrinhos: os ganchos

Em A queda de Murdock, o gancho é o fato de Karen Page vender a identidade do Demolidor. 


Para o profano o termo pode parecer engraçado, mas quem está acostumado a mexer com quadrinhos provavelmente conhece a palavra gancho O gancho é algo que puxa a história. Na citada A Queda de Matt Murdock, o gancho é o fato de Karen Page vender a identidade do Demolidor. É isso que vai dar origem à trama.
                Nesses mais de 100 anos de quadrinhos, o gancho assumiu muitas formas. Nas tiras de aventura, por exemplo, o último quadrinho era sempre uma situação de suspense que proporcionava o gancho para a tira seguinte. Por exemplo, no começo de uma nova aventura, Flash Gordon chega a uma floresta. Os primeiros quadrinhos são usados para ambientar o leitor. Mas no último quadrinho irá aparecer uma  criatura, que irá atacar Flash. Conseguirá o nosso heróis se livrar das terríveis garras do Monstro da Floresta Tempestuosa? Essa situação será o gancho que irá puxar a história seguinte.
Na tira de aventura o roteirista deve resolver o gancho e criar outro gancho. 

                A vida de um roteirista de tiras de aventura não deve ser nada fácil. Em 3 quadrinhos (no máximo 5) ele deve fazer três coisas: 1 recapitular o gancho da tira anterior (Flash está sendo atacado pelo monstro da Floresta Tempestuosa);  2  solucionar o gancho (Flash pega sua arma e atira. O monstro cai no chão, entre convulsões); 3 criar um novo gancho (Enquanto isso, um grupo de caçadores observa os terráqueos. "Hum... o rei gostaria de ter esses especimes em seu zoológico", pensa o chefe dos caçadores).
                O surgimento dos gibis deixou o gancho para o início e o fim das revistas. Como expliquei anteriormente, tudo que ocasiona uma história pode ser considerado um gancho. Mas com Stan Lee surgiram coisas do tipo: "Thor está preso sob os escombros e vai ser atacado pelo Monstro da Dimensão Soturna. Conseguirá ele alcançar o seu Mjorn?". E lá tínhamos motivo para mais uma revista...
                Depois começaram a surgir ganchos mais refinados. A história parava no meio, em geral em plena ação, e acompanhávamos um acontecimento aparentemente sem importância, que acabava tendo grande importância mais à frente. Chris Claremont costumava fazer isso nos X-Men.
Neil Gaiman usou ganchos mais complexos em Sandman

                Outros autores são ainda mais refinados. Neil Gaiman é um deles. No primeiro número de Sadman vemos que o Senhor dos Sonhos  ficou preso durante anos e que, enquanto isso, seus objetos de poder foram espalhados pelo mundo. Sabemos, então, que a primeira saga mostrará o Senhor dos Sonhos tentando recuperar seus objetos.
                Esse tipo de gancho específico, além de ser um recurso muito interessante, é também uma delícia para o escritor. Ele serve para que tenhamos em mente os passos que vamos seguir e nos livrar de maiores preocupações, ao menos enquanto durar a saga.
                Mas Gaiman trabalha com um outro tipo de gancho, esse mais complexo. São pequenos detalhes no meio da história que, depois, vão puxar outra história ou até uma saga. Assim, vemos no capítulo 4 de Sandman que o Mestre dos Sonhos encontra uma mulher no inferno e nos perguntamos quem é ela e em que situação os dois se conheceram. No mesmo número vemos Lúcifer sendo humilhado e prometendo vingança, o que vai dar origem à série Estação das Brumas. Esse tipo de gancho é complexo porque você deve ter uma boa noção do todo. Em entrevistas, Gaiman diz que planejou, desde o começo, toda a história de Sandman, do primeiro ao último número.
                Quando um gancho não é resolvido, costuma-se dizer que o escritor deixou uma ponta solta. Pontas soltas são características de maus escritores.
Um último comentário sobre os ganchos é que eles são fundamentais nas histórias policiais. Eles são as pistas deixadas ao leitor. Um bom escritor implanta uma dezena de pistas na história, mas o faz tão disfarçadamente que o leitor, coitado, nem nota...

terça-feira, 25 de junho de 2019

O uivo da górgona mistura zumbis e crítica social


Um som se espalha pela cidade (ou pelo estado, ou pelo país, ou pelo mundo?). Um som que ouvido transforma as pessoas em seres irracionais cujo único o objetivo são os instintos básicos de violência e fome. É o uivo da Górgona.
Acompanhe a história dos sobreviventes neste livro de terror, uma história de zumbis diferente, em que qualquer um pode se transformar, bastando para isso ouvir o terrível uivo da górgona.
Escrito em capítulos curtos, o livro transforma o suspense em elemento de fantasia, prendendo o leitor da primeira à última página. 
Pedidos: profivancarlo@gmail.com. 

segunda-feira, 24 de junho de 2019

A terrível vida real de Tom Strong

A terrível vida real de Tom Strong é o primeiro volume da série lançada pela Panini escrita e desenhada exclusivamente por convidados. Escritores e artistas receberam uma tarefa inglória: igualar a fase de Alan Moore, explorando aspectos ainda não explorados na série. 
O resultado é irregular. 
No geral, as histórias seguem uma média. Mas dois se destacam, por motivos diversos. 
Steve Aylett e Shawn McManus fazem a pior história da revista. Mal-ajambrada, muitas vezes sem sentido e distantes da proposta do personagem. Personagens irreais surgem do nada e não há preocupação em se criar verossimilhança para eles. Parece alguém tentando imitar Grant Morrison na Patrulha do Destino, mas com o personagem errado.
O melhor exemplo é a história que dá título ao volume, escrita por Ed Brubaker e com desenhos Ducan Fegredo. Nela, usando um artefato maia, um vilão consegue criar uma realidade em que Tom Strong não existe - e o herói se torna um simples operário em um mundo decadente, sujo, repleto de políticos corruptos. É o tipo de história que se encaixa no personagem e a sacada irônica do final é realmente genial.

quinta-feira, 20 de junho de 2019

Tio Patinhas zero, da editora Culturama


Ano passado os fãs de quadrinhos foram surpreendidos pela notícia de que a editora Abril deixaria de publicar quadrinhos Disney. Surpreendente porque Pato Donald foi a primeira publicação da editora.
Este ano, para alegria dos fãs de quadrinhos, a editora Cultura anunciou que retomaria a publicação dos personagens. A Culturama já vinha publicando material Disney desde 2015 e seu esquema de vendas pode ser uma solução para esta época de falência das bancas: através de gôndolas em lojas e mercados.
Eu comprei Tio Patinha número zero em uma loja de utilidades (Comercial Lages) e foi uma bela surpresa. A edição é caprichada. O papel tem uma qualidade melhor que o da Abril, o preço está em conta (R$ 4,50) e a seleção de histórias é realmente especial.
A revista abre com material italiano, “O grande amor do Tio Patinhas”, de Bruno Concina e Giorgio Cavazzano. A história mostra uma nova personagem, a empresária Mac Gold, que vence uma licitação em Patópolis e descobrimos que é o grande amor do Tio Patinhas. Os material italiano é especial, com destaques para os desenhos, mas aqui o roteiro apresenta também uma dinâmica interessante, com o Patinhas tentando reconquistar a concorrente – a ponto de gastar dinheiro!
“O papel do dinheiro”, com roteiro do norueguês Terje Nordberg e desenhos do espanhol Maximino Tortajada Aguilar tira seu humor do contraste entre Patinhas e os novos ricos da internet: no clube dos milionários, o pato encontra Bit, um garoto que fez fortuna na Patonet. É o melhor roteiro do volume, com uma boa sacada final.
“Ouro esquecido”, a história que fecha o volume lembra muito as melhores histórias de Carl Barks e de seu mais famoso discípulo, Don Rosa. Os roteiros são do americano Byron Erickson e os desenhos do espanhol Francisco Rodriguez Peinado.
Enfim, como diz a capa, é uma edição de colecionador.   

domingo, 9 de junho de 2019

Super powers 3 - Liga da Justiça

Quando a revista da Liga da Justiça chegou ao seu número 200, a DC publicou uma edição especial com mais páginas e uma história completa escrita pelo renomado roteirista Gerry Conway.
Para comemorar, o roteirista bolou uma trama que remetia diretamente à primeira aventura da Liga, quando eles enfrentavam alienígenas que usavam a Terra como arena de guerra para decidir quem governaria seu planeta natal. Na história, os membros clássicos da Liga são vítimas de sugestão hipnótica para reunir os meteoros, liberando novamente os extraterrestres.
Isso, claro, acaba sendo uma desculpa para que os novos membros enfrentem os clássicos, numa história tipicamente Marvel (vale lembrar que Conway foi um dos principais roteiristas da Marvel).
O roteiro é ok, eficiente, embora não se compare a trabalhos melhores de Conway, como Esquadrão Atari. Mas a grande atração da revista é o incrível time de artistas reunidos nesta única edição. A história principal fica por conta de George Perez, mas o time de convidados inclui Jim Amparo, Dick Giordano, Brian Bolland, Carmine Infantino, Joe Kubert. Um verdadeiro show de grandes talentos da DC.

Essa história foi publicada na revista Super-powers 3, da editora Abril, em novembro de 1986. A Abril reduziu a belíssima capa dupla para uma capa simples e tirou o fundo, prejudicando em muito o impacto da capa.

domingo, 2 de junho de 2019

Howard, o pato


A década de 1970 na Marvel foi a era dos quadrinhos estranhos, fora da caixinha. A regra parecia ser “não há regra” – e eram muitas as experimentações. Surgiram desde quadrinhos sobre heróis espirituais, como Warlock, até quadrinhos sobre artes marciais (Mestre do Kung-fu). Até personagens clássicos, como o Dr. Estranho, tiveram aventuras que saiam completamente do comum – com o personagem contracenando com uma lagarta fumadora, por exemplo. Tudo isso capitaneado por uma geração de hippies que aproveitou ao máximo a abertura que a indústria de entretenimento estava lhes dando naquele momento.
Mas nenhum quadrinho foi tão revolucionário, tão fora da caixinha quanto Howard, o pato.
 O personagem surgiu como coadjuvante em uma aventura do Homem-coisa, escrito por Steve Gerber e desenhado por Val Maverick.
O monstro se envolvia em uma trama de encontros de realidades e – entre os personagens que surgiam estavam um bárbaro e um pato falante. Ao final da história, o pato simplesmente sumiu em meio às realidades, desaparecendo da história.
Seria o fim dele, mas os leitores gostaram do personagem e começaram a escrever para a Marvel pedindo mais histórias com aquele personagem. Roy Thomas, editor-chefe da editora na época, achava que o personagem não se sustentaria num título, mas Gerber garantiu que daria conta do serviço e o personagem ganhou uma segunda chance, primeiro na revista do Homem-coisa, depois com título próprio. O desenho ficou sob a responsabilidade de Frank Brunner (que havia ilustrada a fase mais lisérgica do Dr. Estranho) e depois de Gene Colan.
E eram aventuras absolutamente subversivas. Howard, depois que quicar em várias realidades, vem parar na terra, onde encontra uma linda moça que seria sua parceira e passa a viver suas aventuras enfrentando os tipos mais estranhos, a exemplo do Homem-nabo (vindo de uma espécie de vegetais agressivos que superaram os limites de suas raízes para se tornarem empreendedores galácticos), O Pestana (um artista com sonambolismo) e muitos outros.
Em uma das histórias, a dupla é vítima de uma gangue de valentões e Howard se torna mestre de Quac Fu em apenas três horas de treino!!! Aliás, essa é uma das aventuras mais divertidas, uma belíssima brincadeira homenagem ao personagem Shang Chi, da Marvel desenhada por John Buscema.
Howard não parava. Em um momento ele estava enfrentando um mágico contador espacial, em outro estava na cidade grande se deparando com uma velha gorda e adepta de teorias da conspiração, em outro estava num castelo vitoriano caindo aos pedaços enfrentando um monstro Frankstein feito de biscoito. Em outras palavras: era piração em cima de piração.
O ponto alto desse processo é quando o Partido Noturno resolve lançar Howard como candidato à presidência – e este passa a ser alvo de todo assassino profissional do país.
O personagem fez tanto sucesso que se tornou filme, uma película pouco inspirada que tinha pouco a ver com toda a subversão dos quadrinhos.

sábado, 1 de junho de 2019

Como escrever quadrinhos


O livro Como escrever quadrinhos ensina os fundamentos básicos do roteiro a partir da experiência do premiado roteirista Gian Danton. Valor: 25 reais (frete incluso). Pedidos: profivancarlo@gmail.com.

LinkWithin

Related Posts with Thumbnails