Um roteiro, seja de quadrinhos ou de cinema, não é
literatura. Ao contrário de um livro, ele deve ser feito para ser visto.
Quadrinhos e cinema são mídias visuais. O que pode ser
mostrado com imagens, deve ser apenas imagem.
Se um personagem é um adolescente que gosta de rock,
mostrá-lo num quarto com posteres de banda de rock ou com camisa de uma banda
cantando uma canção de sua banda predileta é suficiente para repassar a
mensagem. Não há necessidade de um narrador ou um personagem dizendo:
"Fulano gosta de rock".
Algumas das melhores sequências do cinema são mudas, como a
abertura do primeiro De volta para o futuro, com a sequência no laboratório que
nos conta tudo que precisamos saber sobre o Dr. Brown, inclusive que ele roubou
o urânio do qual se fala na TV.
Outra abertura genial é a de Dois filhos de Francisco. Toda
a sequência inicial, do pai pelejando para conseguir pegar rádio na roça mostra
sua paixão por música que será o fio condutor de toda a trama.
Assim, as ações é que contam a história e nos dão a
motivação dos personagens. Em Contato, a sequência da morte do pai será
fundamental para que a cientista Ellen busque comunicação com outros mundos e,
quando os ETs aparecem para ela, sacamos que no fundo sua busca por contato era
também uma forma de resgatar o pai (o alienígena aparece com o rosto do pai da
cientista).
Maus roteiristas desconhecem isso e tendem a explicar tudo
com diálogos ou narração em off. Um roteirista iniciante colocaria, na cena do
encontro de Contato, uma narração em off, nos dizendo algo como: "Naquele
momento Elleanor percebeu que sua busca por contato era, na verdade, uma forma
de voltar a encontrar o pai".
Isso de explicar a história com diálogos é algo tão
irritante que ganhou até um nome próprio, uma gíria: bife (alguns também usam
muleta).
Maus roteiristas usam e abusam do bife, explicando o tempo
todo os fatos ao expectador. Exemplo disso é a novelista Glória Pérez, famosa
por adorar um bife. Na novela Caminho da Índia, por exemplo, toda vez que
tínhamos uma cena com a psicopata Yvone, na sequência aparecia uma psicóloga
explicando as ações da psicopata.
Talvez o exemplo mais famoso de bife, ou muleta, tenha sido
uma das cenas finais de Psicose, em que um psicólogo explica o comportamento de
Norman Bates. A cena é tão didática que parece uma concessão do diretor, Alfred
Hitchcock, para os produtores, no sentido de tornar o filme mais compreensível
para a grande massa. Felizmente a cena seguinte, de Norman sentado na cadeira,
olhando para o expectador e sua mãe falando por ele salvam o final. Aliás,
bastava essa cena final e o expectador entenderia tudo - sem a necessidade do
bife psicológico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário